Por Vitalina de Assis.
Desejo retratar-me, retirar palavras ditas em momentos
de insensatez como se fosse possível recolher todas elas e lança-las no
esquecimento. Reconheço a impossibilidade, mas venho aqui, diante do Universo
retratar-me, pedir desculpas, tentar desdizer o que dito foi.
Não desejo cultivar a raiva, plantar sentimentos
contraditórios, regar desamores. Quem lucraria com tal colheita? Seria possível
nesta vida, esquecer duras palavras, impedir que continuem a doer em nossa
memória ainda que pareçam possuir um requintado gosto para angústias e
dissabores? Não creio que todas as pessoas sejam assim, (algumas ruminam a
raiva a vida inteira e se mil vidas tivessem, ainda seria muito pouco para
perdoar) pois a percepção é única e a acolhida passa pelos filtros pessoais de
cada existência e evoluir como pessoa, há de ter como prêmio um equilíbrio cada
vez mais apurado.
O Salmista suplicou: “Põe, ó Senhor, uma guarda à minha boca; vigia a porta dos meus lábios!”. Que gigantesca
responsabilidade estamos jogando no colo de Deus? A nossa mais pura e santa
omissão - que Deus me cale se não posso fechar a boca, é isto mesmo? Na
verdade estes guardas à porta de nossos lábios deveriam ser e são, acredite,
parte do nosso regimento e à espera da nossa voz de comando. Entretanto, ao
invés de ordenarmos silêncio abrimos a boca lançamos a palavra ao vento e
magicamente tentamos resgata-las, horas ou dias e quem sabe, infinitas vidas
depois. Não voltam e quando regressam não o fazem solitárias, desvalidas,
queixosas. Voltam carregadas ao extremo
e o efeito bumerangue, após descrever a curva na orelha do outro, retorna
pesado às mãos do lançador.
Fomos feitos à imagem e semelhança de
Deus, correto? Então devemos estar cientes de que, tal como Deus, nossas
palavras nunca serão meras palavras, elas possuem poder. “Assim será a minha palavra, que sair
da minha boca; ela não voltará para
mim vazia, antes fará o que me apraz, e prosperará naquilo
para que a enviei”.
Você consegue compreender o peso desta
afirmativa bíblica? Deus é amor em toda a sua plenitude, em um nível que jamais
seremos capazes de igualar, ou até mesmo compreender. De sua palavra proferida,
não há o que temer, ela vem sobre nós e só volta para Deus após prosperar,
cumprir seu desígnio e não há outro Ser, no universo inteiro, que nos queira
tão bem. Possuidores deste mesmo poder sobre nossas próprias palavras, há de se
ter um cuidado extremo ao proferi-las. Melhor calar, vigiar a boca. Vigiar. O
que falamos vai voltar para nós e não voltará sem ônus, então devemos ser
ponderados e justos. O salmista, conhecedor do poder de suas palavras solicitou
ajuda aos céus para não proferir o mal. Como é fácil criticar, tirar valores,
ferir o orgulho de quem nos ouve. Difícil é conferir virtudes, abençoar,
exercer a generosidade no falar. Medir o efeito - ouvir-se primeiro, antes de
lançar uma palavra da qual não teremos controle algum, deveria ser nosso
exercício diário.
O que meus lábios proferiram hoje? Palavras
que impulsionam e trazem alegrias, ou palavras néscias e desvirtuadoras? Que
minha consciência, generosidade e bom senso sejam os guardas, às portas dos
meus lábios. Se loucamente já proferi o que não deveria – perdão, perdoa-me,
perdoo-me.